sábado, 31 de janeiro de 2009

{...}Um pouco espantada


Um pouco espantada, o calor da tarde então envolveu-a, inquieto, pesado. Nada se transformara no campo que continuou cheio de imóvel sol. No entanto por um instante a moça não o reconheceu e não se reconheceu, e se se olhasse ao espelho veria grandes olhos olhando-a mas não se veria. Com a acuidade da estranheza, notou na própria mão uma veia que havia anos não notava, e viu que tinha dedos magros e curtos, e viu uma saia cobrindo os joelhos. E sob tudo o que ela era, sentiu alguma coisa: sua própria atenção. Um pouco aflita, olhou em torno. Por uma obscura necessidade de preservação, estava procurando recuperar no campo aquele minuto em que ela ousadamente aceitara amar o homem: procurava recuperar o minuto para des­truí-lo. Mas, estonteada, talvez soubesse que também a neces­sidade de destruir amor era o próprio amor porque amor é tam­bém luta contra amor, e se ela o soube é porque uma pessoa sabe. 

A Maçã no Escuro

Nenhum comentário: